Fazer a biografia de Edgar Franco não é nada fácil. Artista múltiplo, pesquisador, professor-doutor, ao se abordar a vida e o trabalho criativo de Edgar corre-se o risco inevitável da parcialidade ou da fragmentação, dada a imensidão de sua obra. Esse desafio, contudo, deve ser ensaiado, abordando partes essenciais do percurso do autor, como o fizeram Elydio dos Santos Neto em seu pós-doutorado, que resultou no livro “Os quadrinhos poético-filosóficos de Edgar Franco”, lançado em 2012 pela Marca de Fantasia.
Pela mesma editora, temos também “Edgar Franco e suas criaturas no Banquete de Platão”, ensaio instigante da professora Nadja Carvalho, que investiga o potencial erótico nos quadrinhos e na cosmogonia do autor. Evidentemente são recortes interessantes sobre o universo criativo de Edgar Franco, mas que sempre necessitarão de complementação, sobretudo porque sua obra, bem como seu ser, configuram-se em processo permanente de transmutação.
Esse processo teria forte inflexão no final de 2011, quando ao completar 40 anos Edgar assumiu a identidade – ou melhor, a personificação evolutiva – de ciberpajé, confluindo as perspectivas do mundo tecnológico com as raízes e a ancestralidade dos rituais xamânicos, que passaram a ocupar cada vez mais espaço em sua vida e arte. Esse processo excepcional de transformação e elaboração artística é o que se encontra analisado neste livro, escrito pelo próprio Edgar em parceria com Danielle Barros, aliás, IV Sacerdotisa da Aurora Pós-humana.
Danielle, além de admiradora de Edgar, estudou sua obra em profundidade. Envolveu-se apaixonadamente no universo fantástico do autor, donde se percebe no livro o olhar reverente, mas não translúcido sobre seus processos evolutivos. Como IV Sacerdotisa, incorporou-se ao projeto mítico-tecnológico de Edgar, participando como parceira de fanzines, quadrinhos e performances lúdico-teatrais.
O testemunho de Edgar, acompanhado pela investigação arguta de Danielle, é um presente aos apreciadores da obra desse excêntrico autor, que tem levado a arte para além das formatações comerciais, transformando-a num processo de vida. Evidentemente, não é tudo o que se tem a apreender de Edgar – Danielle já indica a prospecção de outros enfoques sobre sua obra –, mas é um documento importante para quem quer conhecer os meandros criativos do artista.
Henrique Magalhães |