Os quadrinhos franceses se destacam por sua produção abundante, mas particularmente autoral. Em contraponto aos quadrinhos de massa, sem deixar de se enquadrar na indústria cultural, as produções do país primam pelo requinte editorial, pelo conteúdo introspectivo e pela expressão idiossincrática de seus autores, além do forte caráter experimental.
Foi com essa inquietação e espírito inovador que em 1990 fundou-se a editora independente l’Association, reunindo boa gama de jovens autores que tomavam com as próprias mãos o encargo de se editar. Dentre esses autores figuravam Lewis Trondheim, que lida até hoje no seio das publicações francesas independentes, mas não só.
Com uma obra ampla e expressiva, Lewis, que nasceu na França em 1964, publicou dezenas de álbuns solo e em parceria com diversos autores, tanto na própria editora que ajudou a criar quanto nas renomadas editoras do mercado francês, a exemplo de Delcourt, Fantagraphics, Le Lézard, Cornélius, Le Seuil, Dargaud, entre outras. Apesar do reconhecimento de sua obra e do acesso irrestrito ao mercado, Lewis e o grupo l’Association preservam a liberdade proporcionada pela edição independente, reforçando o catálogo da editora e abrindo espaço para novos autores.
A atitude de vanguarda de l’Association para os quadrinhos franceses se configura por iniciativas que passam ao largo das propostas editoriais comerciais mais ousadas. Pelo grupo independente, Lewis foi um dos criadores do selo Oubapo – l’OUvroir de BAnde dessinée POtentiel – projeto editorial que propõe a experimentação com a linguagem dos quadrinhos em formatos inusitados. Fundou ainda o selo editorial Shampooing. É diretor de texto das séries de animação “Allez raconte” e “OVNI”.
Em 2005 lhe foi conferido o título de Chevalier des Arts et Lettres (Cavaleiro das Artes e Letras) e em 2006 o Grand Prix do Festival d’Angoulême, o mais importante festival de quadrinhos da França e um dos maiores do mundo. Seu personagem “Le Fauve” foi adotado como mascote do Festival d’Angoulême.
Em sua estreia no Brasil, numa parceria da Marca de Fantasia com l’Association, e com o patrocínio da Embaixada Francesa no Rio de Janeiro, da Aliança Francesa de João Pessoa e do Mestrado em Comunicação da UFPB, Lewis nos apresenta duas séries de histórias em quadrinhos, lançadas originalmente em edições separadas, mas reunidas em álbum na edição brasileira, intitulada Gênesis Apocalípticos + Os inefáveis. São histórias de uma visão muito particular sobre o mundo e o ser humano, um trabalho de forte aspecto reflexivo que se traduz numa sutil e delicada ironia. As pequenas histórias que compõem o álbum alcançam a essência que caracteriza as obras poéticas.
As primeiras histórias de Gênesis Apocalípticos foram feitas em 88-89, publicadas como suplemento gratuito do fanzine do autor. Em seguida, foi feita uma coletânea com as HQ para presentear os assinantes de l’Association, sendo inteiramente redesenhadas. Nesta série se encontram os quadrinhos mais metafísicos de Lewis Trondheim, que aborda com humor as teorias sobre a Criação, a Evolução e o Fim do Mundo. Com Os inefáveis, Lewis apresenta histórias banais do quotidiano com homens e mulheres “batatas”, poeira, insetos, estrelas, lenços, árvore, extraterrestres. Lewis Trondheim, em fábulas curtas, explode em humor e talento. Essas HQ foram parcialmente publicadas na revista francesa Lapin, editada por l’Association.
A presença de Lewis Trondheim em João Pessoa, nos dias 18 e 19 de outubro de 2011, para uma “conferência desenhada” e o lançamento do álbum faz parte da terceira edição do seminário “História em Quadrinhos: Reflexão e paixão”, organizado pelo Núcleo de Artes Midiáticas do Programa de Pós-Graduação da UFPB em parceria com a Aliança Francesa e a loja especializada Comic House. Essa atividade mais a realização do concurso de tiras humorísticas GAG, promovido pela editora Marca de Fantasia, reforçam o campo de pesquisa sobre quadrinhos, desenvolvido por professores e alunos do Mestrado e aficionados na Paraíba.
A vinda de Lewis Trondheim não teria sido possível sem o empenho incondicional da Aliança Francesa de João Pessoa, bem como o essencial apoio da Embaixada da França e de L’Association. Contamos também com a participação efetiva do Núcleo de Artes Midiáticas do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UFPB, da livraria Comic House, da Usina Cultural Energisa e da editora Marca de Fantasia.
H. Magalhães |