Irreverente, às vezes desbocada e só levemente imoral, Camila, de Julie Albuquerque, é a expressão de um mundo em conflito, que vive cerceado por padrões morais ancestrais e estúpidos. Não há como não associar a personagem à criadora, já que Camila pode ser considerada o alter ego de Julie, que transpõe para os quadrinhos o enigmático universo do travestismo imiscuído com a transexualidade.
Embora o sexo esteja quase sempre presente nas tiras e pranchas, o mundo de Camila faz reiteradamente referência às bandas de rock preferidas da autora, sobretudo as que circulam fora dos esquemas comerciais. Ou seja, Camila trafega pelas zonas periféricas, diria marginais, onde sua figura paratópica encontra espaço para se exprimir sem censura.
Embora a produção de Camila seja esporádica - reunimos praticamente tudo o que já foi criado com a personagem e publicado em várias edições de seu fanzine -, o trabalho de Julie ganha densidade pela originalidade estética de sua obra, que ela domina bem, e pelo conteúdo excêntrico e provocador, num meio tão marcadamente machista como o dos quadrinhos.
Henrique Magalhães |