Maria na Marcha
Em maio de 2012 Shiko me trouxe uma grande notícia: fora incumbido de fazer o cartaz da Marcha das Vadias, que circularia as ruas do centro da cidade no dia 6. A novidade é que escolhera as personagens Maria, Pombinha e Zefinha para representar esse ato de rebeldia feminista.
A marcha é uma manifestação que ocorre em várias cidades do mundo em resposta à mentalidade conservadora. Iniciou-se em Toronto, Canadá, no dia 3 de abril de 2011, em protesto contra a crença de que as mulheres violentadas são responsáveis por provocar os homens com seu comportamento “errático”. Em oposição a essa mentalidade machista, as mulheres passaram a contar seus próprios casos de estupro e marchar com roupas do dia a dia e também com peças consideradas provocantes, como blusas transparentes, lingerie, saia curta, apenas com sutiã e mesmo com os peitos de fora.
O histórico contestador e irônico de Maria cabe bem no espírito da Marcha das Vadias e a escolha por Shiko para colocá-la como estandarte do movimento, do qual sou entusiasta e participei em alguns momentos, me encheu de orgulho e alegria. Shiko é um dos artistas mais expressivos não só da Paraíba, mas do Brasil, opinião que se confirma pelo reconhecimento de sua arte em âmbito nacional; ter seu traço ilustrando minha personagem é mais que uma homenagem, mas também um puta gesto de carinho.
Contudo, ao ver a obra pronta, senti uma inquietação indescritível. Estava tudo ali, a rebeldia de Maria, a alegria jovial de Pombinha acompanhada pela sempre provocadora Zefinha. Mas não eram minhas Maria, Pombinha e Zefinha. Eram as de Shiko, inspiradas nas idiossincrasias de minhas personagens. Era uma interpretação, maravilhosa e absolutamente condizente com o evento a que se destinava, mas, enfim, era a Maria de Shiko como seria de tantos outros artistas e leitores que se identificam com minha Maria e ressignificam a personagem, e se identificam com ela, reconstruindo-a a partir de sua própria vivência.
Henrique Magalhães, em 27/06/2021
Mais resenhas