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Maria em profusão

Henrique Magalhães


Álbum lançado pela editora Marca de Fantasia

Desde o surgimento, em 1975, Maria passou a figurar nas páginas dos jornais ora como notícia sobre sua criação, ora como registro do lançamento de suas revistas independentes. Maria também ocupou um espaço cativo na página de entretenimento dos cadernos de cultura dos jornais, o que a levou a alcançar um grande público e se tornar emblemática na luta pela redemocratização do país.

Como tira diária, Maria foi publicada no jornal paraibano O Norte entre março e novembro de 1977; em A União, também paraibano, entre abril de 1979 e janeiro de 1980 e entre setembro de 1983 e dezembro de 1984. Saiu no Correio de Pernambuco em junho de 1980.

Entre agosto de 1988 e março de 1989, e julho de 1995 a fevereiro de 1998, com o título de Rendez-vous, por incluir outros personagens, Maria voltou a circular no jornal O Norte. Este foi o último período de publicação diária em tira, que marcou o fim do interesse da imprensa paraibana pela veiculação de quadrinhos.

A década de 1990 ainda teve a internacionalização de Maria, com a publicação no semanário português Algarve Região, da cidade de Faro, entre maio e novembro de 1995. À imprensa paraibana, Maria voltaria apenas em junho de 2012, sendo veiculada até janeiro de 2014 no jornal A União, mas não como tira diária. Em sistema de revezamento com outros personagens de autores paraibanos, Maria foi publicada duas vezes por semana.

Essa história intermitente seria pontuada pela publicação de revistas e álbuns, sempre como autoedição e independentes. Em julho de 1976 saiu Maria: edição de aniversário, comemorativa de um ano de criação numa brochura impressa em mimeógrafo eletrônico, bem no estilo artesanal; em abril de 1977 saiu Veneta n. 1, que traz Maria na capa. Esta era uma pequena brochura em offset que remetia aos folhetos de cordel.

A partir de maio de 1978 tem início a primeira série de revistas Maria, que chegou a dez edições em maio de 1983. Eram revistas com 20 a 32 páginas, ora no sentido horizontal, ora no vertical, que traziam histórias inéditas mais as tiras publicadas nos jornais. Fechando esta fase temos o álbum A maior das subversões, lançado em 1984 e que marca uma inflexão na história da personagem.

Em 1998 Maria volta com o álbum Olhai os lírios no campo, com a compilação de tiras de sua última fase de publicação diária. Este trabalho teve o apoio da Lei de Incentivo à Cultura do município, bem como da escola de línguas Yázigi. Outros álbuns viriam em datas comemorativas. Em 2005 saiu Espirituosa há 30 anos; em 2015, Quarentona, mas com tudo em cima. Este ano Maria alcançou um feito extraordinário: foi publicado em Portugal pela editora Polvo o álbum Seu nome próprio… Maria! Seu apelido, Lisboa!, edição que ganhou o prêmio de melhor álbum de humor no Festival Internacional de BD de Amadora, em 1976. Em 1977 Maria volta a sair em Portugal pela Polvo com o título A maior das subversões.

Há ainda a nova série da revista, agora intitulada Maria Magazine, que começou em 2000 e está no número 10, de 2018. Nesta, Maria divide espaço com outros personagens, com ênfase nos quadrinhos paraibanos.

A repercussão de Maria foi além do público afetuoso que conquistou ao longo dos anos, a Academia também lhe deu atenção privilegiada. Em 2016 lançou-se pela editora Marca de Fantasia o livro Eu sou Maria: humor e crítica nos quadrinhos paraibanos, da professora do Departamento de História da UFPB Regina Behar. A obra é fruto de seu Pós-Doutorado realizado no Programa de Pós-Graduação da Escola de Comunicações e Artes da USP, São Paulo.

Outro estudo foi realizado pela professora Nadja Carvalho, do Departamento de Mídias Digitais da UFPB. Trata-se do ensaio Maria strip… arrepiando na saia, lançado também em 2016 pela Marca de Fantasia. Nadja investiga a formação psicológica da personagem pelo viés da sexualidade.

Em paralelo à pesquisa do Pós-Doutorado, Regina Behar, juntamente com Matheus Andrade realizaram o vídeo-documentário Eu sou Maria, com o autor da personagem. Outro vídeo-documentário foi produzido como TCC dos alunos Karla Karini (direção) e Adelcidio Soares (edição). O vídeo Maria por Marias foi realizado em 2017 no Curso de Comunicação e Mídias Digitais da Universidade Federal da Paraíba.

Maria sempre na luta

Trajetória marcada pela contestação aos desmandos do poder e pela crítica insolente às idiossincrasias, Maria mantém-se sempre atual, inspirada no quotidiano. Em meio ao turbilhão provocado pela internet nos últimos anos, Maria não poderia deixar de botar o bedelho na efervescência política que assolou a todos. A campanha eleitoral para presidente em 2018 foi um momento-chave do confronto ideológico entre forças reacionárias, demagógicas e obscuras contra uma porção de racionalidade que persiste na sociedade.

Inconformada com os rumos do abismo em que nos jogavam, Maria circulou como volante diário pelo WhatsApp no período entre o primeiro e segundo turnos da eleição presidencial. Esse material foi compilado na revista Maria Magazine n. 10, de 2018, que se encontra disponível em versão digital no sítio da editora Marca de Fantasia (www.marcadefantasia.com).

Consolidada a situação adversa, Maria voltou a ser produzida em 2019, agora como página semanal para circular por listas de contatos do WhatsApp e outros compartilhamentos. Num compromisso pessoal, Maria foi lançada regularmente todos os domingos do ano, por vezes mais de uma página por semana. A interação com seu público, formado por muitos antigos leitores, mas também muitos novos, que viram em Maria algo como uma porta-voz, contou com a participação entusiasta nessa jornada interagindo com comentários e até sugestões de temas a serem abordados.

O trabalho foi exaustivo. As tiras ficaram pequenas para Maria, a página tornou-se o espaço adequado. Havia muito o que dizer, o desenho requeria mais elaboração, com cenários e refinamento no traço das personagens. Essa exigência pessoal levou o autor à exaustão.

Em muitos momentos, Maria revoltou-se com as pautas incontornáveis da política nacional, que a fazia sofrer com as arbitrariedades do poder. Agora Maria parou. Talvez esteja dando só um tempo.

Seu testemunho sobre esse momento crítico expõe-se como ferida aberta neste álbum. Ao mesmo tempo em que sente que cumpriu um papel de reflexão nesses tempos conturbados, sente que seu empenho pode ter sido irrisório em meio a esse pandemônio. Nada é definitivo. Como diria Cazuza, ainda estão rolando os dados.

Texto publicado no álbum “Maria: a vida em turbilhão”, em 2020 pela Marca de Fantasia.


Página publicada no álbum "A vida em turbilhão"


Marca de Fantasia
Março de 2024
Editor: Henrique Magalhães
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